quarta-feira, 2 de julho de 2008

O redemoinho da União Européia chamado Sarkozy

Os planos eram grandiosos. Mas agora que a Irlanda rejeitou o Tratado de Lisboa, Nicolas Sarkozy terá que reduzir as suas metas em relação à presidência francesa da União Européia. A resposta dele? Uma atividade frenética.

Na noite da última segunda-feira os parisienses viram uma Torre Eiffel diferente: iluminada com um azul profundo, e com um círculo de 12 estrelas à sua volta. E, esta terça-feira (1), o primeiro dia da presidência interina de seis meses da União Européia ocupada pelo presidente francês Nicolas Sarkozy, trouxe mais novidades. Às 18h30, uma cerimônia no Arco do Triunfo para marcar a transferência do cargo. Mais tarde, Sarkozy recebeu o presidente do Parlamento Europeu, Hans-Gerd Pöttering e o presidente da Comissão Européia, José Manuel Barroso. A seguir, um jantar de gala no Palácio Eliseu - tudo muito majestoso.

Mas não foi apenas a França que assumiu o centro do palco na terça-feira.
Foi também o próprio Sarkozy. O presidente francês, com o seu ego hipertrofiado, os seus modos grosseiros e a sua agenda cheia, será, nos próximos seis meses, a face política deste clube europeu de 27 membros.

E, à primeira vista, parece que o hiperativo Sarkozy não está pretendendo reduzir tão cedo o seu ritmo. As primeiras quatro semanas serão cheias de viagens e eventos: um discurso perante o Parlamento Europeu, em Estrasburgo, em 10 de julho; o Encontro de Cúpula do Mediterrâneo, em Paris, em 13 de julho, seguido do Encontro de Cúpula União Européia-África, em 25 de julho; e mais quatro diferentes reuniões na Comissão Européia entre esta semana e 25 de julho. Como se isso tudo não fosse suficiente, a França é a anfitriã de nada menos do que oito mini-conferências de cúpula em nível de ministérios - sendo que os participantes da área responsável pela exploração espacial chegarão até a voar até a base de lançamento de foguetes em Kourou, na Guiana Francesa.

Há também outros eventos planejados, incluindo dezenas de fóruns importantes, entre eles a conferência "Quem Alimentará o Mundo", em Bruxelas. Haverá comemorações em Paris para marcar o 40º aniversário da união alfandegária, e Lyon sediará o "Seminário Europeu Sobre a Modernização das Inspeções Sanitárias nos Abatedouros". Marselha abrigará o chamado "Evento da Juventude", com o título oficial "Gente Jovem - Agentes do Diálogo Intercultural". O primeiro mês francês da União Européia será coroado por um seminário na pequena cidade de Aix-les-Milles a respeito da questão do "Feedback sobre o Gerenciamento de Desastres Naturais".

Mas, durante o período em que ocupar o cargo Sarkozy precisará focar-se muito mais em desastres de natureza política e econômica do que naqueles criados pela Mãe Natureza. A presidência francesa da União Européia coincide com a disparada dos preços da energia e dos alimentos, o declínio do crescimento econômico, o aumento das dívidas e a inflação galopante. O estado de espírito dos cidadãos da França atingiu um nível historicamente baixo. Apenas um em cada três indivíduos ainda acredita na construção de uma futura Europa - um decréscimo significativo em relação aos 61% registrados apenas cinco anos atrás.

Contudo, Sarkozy estará pensando acima de tudo na esquisita rejeição irlandesa do Tratado de Lisboa no início de junho. Foi um voto que pegou os europeus de surpresa - e o fato atrapalhou aquele que deveria ser um começo brilhante da presidência de Sarkozy na União Européia. E agora a situação ficou ainda pior porque os poloneses estão com dúvidas quanto à ratificação do tratado. Em vez de ser uma plataforma para Sarkozy brilhar, a presidência francesa ver-se-á repleta de preocupações com o árduo trabalho institucional que há pela frente. O antídoto do Eliseu é a atividade frenética - a marca registrada de Sarkozy.

Na campanha para a presidência da França, Sarkozy apresentou-se como o salvador da nova Europa mais enxuta, e ele não pretende permitir que os teimosos eleitores irlandeses o desviem do seu objetivo. Mas Sarkozy é um político habilidoso o suficiente para apresentar-se como uma pessoa que representa as preocupações e os interesses dos 420 milhões de cidadãos da União Européia, que habitam um território que vai do Mar Báltico ao Mediterrâneo.

"A Europa preocupa as pessoas e, pior do que isso, conforme eu descobri, pouco a pouco os nossos cidadãos se perguntam se afinal o nível nacional não seria mais bem equipado para protegê-los do que a esfera européia", disse ele à estação de TV France 3, em uma entrevista na última segunda-feira. E o doutor Sarkozy tem a terapia certa para isso. "Portanto, temos que modificar completamente a nossa forma de construir a Europa", insiste ele, expondo a seguir todas os problemas que deseja enfrentar durante a presidência francesa da União Européia - é o velho remédio com um rótulo novo.

Meio-ambiente, energia, imigração, agricultura e defesa - Sarkozy estabeleceu para si próprio tarefas hercúleas. A sua agenda inteira tem como objetivo lidar com as preocupações diárias das pessoas - ele quer acabar com o imposto sobre o valor agregado dos combustíveis, uma proposta que Bruxelas já rejeitou. "Mas eles aceitaram que eu, como presidente da União Européia, realize um estudo sobre essa questão a fim de tomar uma decisão em outubro", afirma Sarkozy.

Ele também quer reduzir os impostos sobre valor agregado para os restaurantes - uma questão especialmente sensível para as pessoas em um país que deseja ver o seu universo de restaurantes alçado à condição de patrimônio mundial pela Unesco. Mas não se sabe se a Alemanha e a Dinamarca aceitarão tais reduções. É mais provável que ele tenha sucesso com o seu plano para promover reduções de impostos para carros e residências menos agressivos ao meio-ambiente, embora não esteja claro se o seu governo poderá suportar tais presentes fiscais.

Na sua determinação de exibir otimismo, Sarkozy evita assuntos espinhosos como a defesa. Não é de se surpreender, já que toda a Europa estava olhando para a França e Sarkozy neste 1º de julho. E, para garantir que os cidadãos franceses não sintam-se ignorados em meio a toda essa hiperatividade referente à União Européia, o presidente prometeu ficar mais próximo a eles no futuro, apesar dos seus compromissos junto à união. Ele pretende viajar pela França, a fim de manter contato com os cidadãos comuns.
Fonte: Der Spiegel

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