segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Governo quer investir na Petrobras para ajudar exploração do pré-sal: entenda

Especialistas apontam que faltam detalhes ao projeto de lei apresentado.
Investimento ainda depende de cálculos; mudança pode afetar minoritários.

A exploração do petróleo da camada pré-sal, localizada em águas ultraprofundas, é mais cara e difícil do que a dos poços tradicionais. Tirar o óleo e a riqueza "escondidos" a até 7 mil metros de profundidade exige dinheiro. Muito dinheiro. Por isso, um dos projetos do marco regulatório do pré-sal se dedica justamente a isso: aumentar a capacidade de investimento da companhia petrolífera.

O projeto de lei nº 5.941, um dos quatro que compõem o marco regulatório idealizado por uma equipe de ministros do governo Lula, define que será necessário que o governo injete dinheiro na Petrobras para que a empresa tenha capacidade de fazer frente aos gastos para retirar petróleo do fundo do mar. A proposta ainda depende de aprovação do Congresso Nacional.

Em linhas gerais, o governo federal irá capitalizar a empresa com o dinheiro equivalente a, no máximo, cerca de 5 bilhões de barris de petróleo.


















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Dinheiro e ações

A operação funcionará assim: o governo vai comprar mais ações e provavelmente aumentar sua participação que tem na estatal, que atualmente é de 32,2% – o restante está está dividido entre BNDESPar (7,62%), Previ (3,15%) e uma grande quantidade investidores nacionais e estrangeiros.

Segundo o projeto, a União poderá pagar a Petrobras em dinheiro ou títulos públicos – papéis que o governo emite e são trocados por dinheiro no mercado – em valor correspondente ao de exploração e produção de até 5 bilhões de barris de óleo.

Os acionistas minoritários (cujas ações não dão direito ao controle da companhia) também poderão comprar mais papéis: na mesma proporção em que crescer o número de ações detidas pelo governo.

Ao trocar esses títulos e obter dinheiro do governo e dos demais acionistas, a Petrobras usará o "caixa cheio" para comprar o direito de exploração desses 5 bilhões de barris. "O governo emite os títulos e transfere [o dinheiro] para a Petrobras, o que é um aumento de capital", explica Luiz Leonardo Cantidiano, ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Entretanto, segundo especialistas consultados pelo G1, o processo de capitalização da estatal tem fatores que ainda carecem de mais definição. Um deles é como o governo fará para preservar os direitos dos acionistas minoritários da empresa, incluindo os trabalhadores que investiram o dinheiro do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) em ações da companhia.

Entenda quais são os principais pontos do projeto de lei que tem a função de aumentar o poder de investimento da Petrobras e também as "lacunas" que a proposta apresenta, segundo especialistas no setor de petróleo:

1) Por que injetar dinheiro na Petrobras?
De acordo com o projeto de lei, o investimento se justifica pelo interesse da União, que é sócia controladora da Petrobras, em fortalecer a posição da empresa para o investimento na extração de reservas consideradas de baixo risco exploratório e "considerável potencial de rentabilidade".

Na avaliação do professor Helder Queiroz Pinto Junior, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), no entanto, a injeção de dinheiro não seria necessária. “Historicamente, o fluxo de recursos do petróleo é o seguinte: o governo que arrecada da empresa [e não o contrário]. Esse processo de capitalização está invertendo essa mão pela primeira vez”, afirma.

Para ele, a experiência da Petrobras na atividade petrolífera já capacitaria a estatal a conseguir dinheiro para os investimentos no mercado, com fontes privadas, e sem necessidade de “ajuda” do governo.

“A empresa não vai fazer tudo ao mesmo tempo. [A exploração] vai [se] desenvolver ao longo dos próximos 20 anos. Então, para que capitalizar agora? Os bancos em geral não gostam de emprestar dinheiro para a etapa de exploração [de procurar petróleo, que tem mais riscos]. Mas, depois que as reservas são localizadas e mapeadas, eles vêm correndo”, diz.

Já para Cantidiano, ex-CVM, o raciocínio do governo faz sentido. “Ela [a Petrobras] precisa ser fortalecida para fazer frente a esse desafio”, afirma.

2) O que acontecerá com quem comprou ações da Petrobras?
O texto do projeto não especifica, mas o governo tem dito que "toda e qualquer ação" que o governo venha a tomar para capitalizar a Petrobras vai respeitar "todos os direitos" dos acionistas minoritários da empresa (que têm ações com direito a voto, mas não participam do controle da companhia).

Entre os direitos de tais acionistas, está o de preservar a fatia de participação que cada um tem na empresa e evitar que elas sejam reduzidas, caso as regras sejam aprovadas: se o controlador (governo) aumentara participação na empresa, sobrará uma fatia menor de representação para os demais acionistas, o que reduziria também o recebimento dos dividendos.

Para evitar esse “achatamento”, os minoritários devem ter a preferência e a prioridade de compra de mais ações, de acordo com a lei, na mesma proporção que aumentar a participação do governo. Quem não quiser, pode optar por ficar apenas com os papéis que já tem.

3) Acionistas poderão usar o FGTS para comprar mais ações?
Nesta semana, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, descartou a possibilidade de o governo permitir que os acionistas minoritários da Petrobras usem o FGTS para participar da capitalização da estatal e comprar mais ações. Nem mesmo quem já fez isso no passado teria a possibilidade

Tal impedimento, no entanto, poderá gerar o que pode ser interpretado como um dilema: se os acionistas minoritários têm direito a comprar ações na mesma proporção que o governo, por que os que compraram com o FGTS não poderão repetir a operação?

Segundo o advogado Cantidiano, ex-CVM, quando o governo permitiu a compra de ações da Petrobras com o FGTS, em 2000, foram criados fundos que receberiam esse dinheiro dos trabalhadores e comprariam ações. Mas esse fundos não poderiam receber novos investidores, ou dinheiro novo, depois disso.

Para o presidente da Apimec-SP, Reginaldo Alexandre, as discussões sobre o uso do FGTS ainda estão muito "cruas". Segundo ele, é possível que o governo contorne a regra inicial para o investimento na Petrobras com o FGTS, criando uma exceção. "As discussões não avançaram ainda, está tudo muito em tese."

4) Quanto o governo vai investir na Petrobras para ajudar na exploração do pré-sal?
Ainda não se sabe. Principalmente, porque não está definido qual será o valor unitário considerado para calcular o preço de 5 bilhões de barris.

O projeto de lei elaborado pelo governo também não define exatamente de quais quais serão as reservas cedidas à Petrobras. O texto fala apenas que serão campos de petróleo do pré-sal que ainda não foram formalmente concedidos pela Agência Nacional de Petróleo (ANP) nas rodadas de licitação.

No início de setembro, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, afirmou que o valor final da operação vai depender do preço que for estimado para o barril do petróleo, que por sua vez dependerá das condições de exploração no local onde estará esse óleo.

O preço considerado para cada barril deverá será definido por uma avaliação prévia e independente feita por auditores compenentes das reservas e que será certificada pela ANP. É só a partir daí que elas passarão a existir oficialmente.

"Uma vez que se tenha estimativa dos volumes, será possível estimar um custo de produção para o futuro. Depois [é preciso] trazer [esses dados] ao valor presente: tentar adivinhar qual vai ser o preço do petróleo do futuro, qual a taxa de desconto a aplicar", diz Reginaldo Alexandre, da Apimec-SP.

Além disso, o fato das reservas estarem em águas ultraprofundas gera uma série de riscos: não se sabe exatamente o volume das reservas, quanto custa para se extrair óleo, como funcionará o processo.

"[O governo] está fazendo isso tudo em um regime de informação incompleta, você ainda não tem certeza sobre muita coisa. Por enquanto, ele está dando um cheque em branco à Petrobras", diz o professor Helder Queiroz Pinto Junior, da UFRJ.

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